¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

Powered by Blogger

 Subscribe in a reader

segunda-feira, março 21, 2011
 
O CUSTO PAULISTANO: AO BAIXAR
OS PREÇOS, RESTAURANTES AINDA
SÃO MAIS CAROS QUE OS DE PARIS



Começa hoje em São Paulo a oitava edição de um evento gastronômico que não me cheira bem, o Restaurant Week (RW), com a participação de 223 restaurantes que oferecem menus a preço menor que o usual. Durante o almoço, uma refeição – sem bebida e muitas vezes com o couvert cobrado a parte – custará 29 reais. Mais um pouco e chegaram aos preços de Paris ou Madri, onde você pode almoçar o ano todo por 10 euros - 24 reais, na cotação de hoje – sem que para isso os franceses precisem organizar qualquer evento.

Durante a janta, a refeição custará 39,90 reais. Com mais sete reais, você come no sofisticado Le Procope, de Paris, considerado o restaurante mais antigo do mundo, que tem um menu a 19,90 euros. O ano todo, e não durante apenas uma semana.

O RW tem seus senões. Como aos paulistanos agrada a idéia de comer em restaurantes estrelados, você precisa reservar mesa com antecedência. Se não reservou, pode esperar até uma hora na fila. Com um detalhe: isso se quiser comer pelo RW. Se aceitar os preços normais da casa, a mesa surge na hora.

Mais dois detalhes safados. Restaurantes que ofereçam música ao vivo vão lhe empurrar o couvert artístico. Por outro lado, muitos restaurantes omitem os pratos que normalmente servem e oferecem outros de confecção mais barata. Ninguém vai esperar angulas ou trufas por 30 ou quarenta reais, é verdade. Mas se a intenção do RW é aproximar da gastronomia pessoas a ela alheias, deveriam oferecer seus pratos usuais.

Mais ainda: em muitos restaurantes, os garçons servem com pressa, para desocupar as mesas. Ou seja, se você quiser ser roubado, participe do grande evento. O RW é um embuste gastronômico. Quando São Paulo baixa os preços da restauração, mal consegue se aproximar dos preços de Paris.

Ainda há pouco eu afirmava que não é o custo da mão de obra e do metro quadrado que encarecem a restauração no Brasil, como pretendem os proprietários de restaurantes. Nem a alta incidência de imposto. O que está tornando o Brasil um dos mais caros países do mundo é essa maldita mania de status de uma nova geração de nouveaux riches, que considera que pagar caro os torna mais nobres, refinados e elegantes que os demais mortais.

Ao que tudo indica, os jornais estão começando a intuir o óbvio. Leio no Estadão que São Paulo é atualmente a cidade mais cara das Américas, de acordo com a Pesquisa Global Mercer do Custo de Vida. Freqüentar uma academia de ginástica na capital paulista sai pelo dobro do preço cobrado em Londres, enquanto jantar em um restaurante estrelado por aqui é mais salgado que um similar em Paris.

Se é! Mas isto não é de hoje. Faz uma boa década que comer em Paris é mais barato do que comer em São Paulo. O Estadão recém descobriu que há em São Paulo um custo particular, o "custo paulistano": cobra-se mais para conferir um aspecto de luxo ao produto ou ao lugar.

"É um custo de status. Você pode colocar um preço alto, cobrar R$ 500 por um ingresso de show, R$ 25 pelo cinema, R$ 200 por um jantar, e vai ter gente para pagar essa conta, porque o mercado está aquecido e porque o paulistano paga aquilo quase como símbolo de ostentação", diz o economista Gustavo Fabron, que trabalha com tendências de mercado para empresas estrangeiras que abrem filiais em São Paulo. "Essas indulgências custam até 250% a mais do que em outras capitais brasileiras e fazem os preços aqui ficarem absurdos".

Duzentos reais são 85 euros. Por esse preço, duas pessoas comem muito bem em Paris. Em dezembro passado, eu a Primeira Namorada pagamos no máximo 100 euros por uma janta. Nos mais charmosos restaurantes às margens do Sena. Com vinho e ainda algum Calvados. Os restaurantes de São Paulo, quando baixam os preços, continuam sendo mais caros que os de Paris. Se você quer comer bem e barato, trate de atravessar o Atlântico.

O homem é o homem e suas circunstâncias, dizia Ortega y Gasset. Dadas minhas circunstâncias, não posso eximir-me de pagar caro. Uma vez por ano, pelo menos, viajo para onde se pode comer e beber mais barato.