¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, abril 27, 2009
 
RESPOSTA AO DR. BARGHINI


Dr. Barghini:

Como afirmei em meu artigo, não tive acesso à sua tese. Minhas considerações foram tecidas a partir de suas declarações sobre seu trabalho à Folha de São Paulo. Soou-me um tanto bizarra sua afirmação de que “os ribeirinhos e os caboclos sabem que a luz atrai insetos". Ora, Dr, quem não sabe disso? Não é preciso ser ribeirinho ou caboclo para se chegar a tal conclusão. Qualquer cidadão urbano que abra a janela de seu apartamento e deixe uma luz acesa numa noite quente sabe disto, sem maiores pesquisas nem metodologias acadêmicas.

Considero que uma tese de doutorado há de resultar em uma observação original, ainda não formulada, sobre a área de estudos. Tampouco me parece adequado submeter a uma banca a prosaica observação de que doze pessoas foram contaminadas pelo mal de Chagas por causa de uma lâmpada inadequada que iluminava uma revenda de caldo de cana. Isto é questão pertinente aos serviços de saúde de uma comunidade. De qualquer forma, acredito que sua tese seja uma útil colaboração a esses mesmos serviços. A questão é outra. Tal pesquisa tem de ser objeto de um longo doutorado? Não me parece ser o caso. Será necessário coletar insetos para provar que insetos são atraídos pela luz? Inseto coletado não prova atração alguma.

Mas a questão mesmo ainda é outra, e não é de hoje que a discuto. E sim desde meus dias de magistério universitário, quando vi em meu departamento professores em idade provecta postulando mestrados e doutorados. Para quê? Para aumentar sua aposentadoria? Para pendurar o diploma na parede para contemplação de filhos e netos? Para ostentá-lo como louros ganhos ao fim da vida? Creio inclusive ter prolongado a vida de um de meus orientandos, ao dissuadi-lo de persistir em uma tese impossível. Era cinqüentão e cardíaco e vivia sob estresse permanente, por pressão acadêmica. Mostrei-lhe por A + B que sua tese
1° - não tinha sentido;
2º - não o levaria a lugar nenhum e, pior que tudo,
3º - estava minando sua saúde.

Ele foi-me grato e respirou aliviado. Sobreviveu mais quatro anos, tranqüilos e sem maiores sobressaltos. Em verdade, vou um pouco mais longe. Questiono não apenas os doutorados em idade provecta, mas o doutorado em si. Considero mais uma perversão universitária, à qual são obrigados professores que às vezes não têm pendor algum para pesquisa. Por que um professor há de ser cientista? Isso sem falar que toda banca é uma farsa. Toda tese já está aprovada quando chega à banca. Então, para que todo aquele teatro? Para que os examinadores exibam suas plumas e exerçam seu poder sobre o examinando?

Além do mais, qual o destino das teses senão o pó das bibliotecas? Em 2005, a Capes previa investir R$ 3,26 bilhões em seis anos para passar de oito mil para 16 mil titulados ao ano. O Plano Nacional de Pós-Graduação apresentado pela Capes ao então ministro da Educação, Tarso Genro, propunha a aplicação nos seguintes seis anos de R$ 1,66 bilhão a mais em bolsas e fomento de pós-graduação, o que permitiria passar dos atuais oito mil doutores titulados por ano para 16 mil em 2010. O plano “será acolhido integralmente", disse Genro na ocasião. Se foi, não sei. Faço votos de que não tenha sido.

Ora, para que queremos 16 mil doutores? Dezesseis mil doutores constituem alguma prioridade para o país? Não bastassem os jornalistas e engenheiros formados que trabalham de taxistas ou fiscais do trânsito, teremos doutores conduzindo táxis ou aplicando multas nas ruas. Sempre formados à custa do contribuinte. O que me lembra um pouco Fidel Ruz Castro – aliás Dr. Honoris Causa pela Universidade Federal de Santa Catarina – respondendo às acusações de que em Cuba até as universitárias tinham de prostituir-se:

- Nada disso. Ocorre que em Cuba até as prostitutas têm grau universitário.