¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, janeiro 27, 2009
 
EVO MORALES
PARTE BOLÍVIA
EM 37 PAÍSES



Se há algo que não entendo em um país são diferentes justiças para diferentes grupos de cidadãos. No Brasil, temos a justiça que nos foi legada pelos legisladores da nação... e mais umas quatro ou cinco. Deputados e ministros têm foros privilegiados. Índios podem matar seus filhos, enterrá-los vivos, podem estuprar e espancar suas mulheres, podem interditar estradas, invadir prédios e fazer reféns. Negro, quando disputa uma vaga na universidade, tem mais direitos que um branco. Os sem-terra também podem interditar estradas, invadir prédios fazendas, fazer reféns e destruir laboratórios de pesquisa. Ou seja, o tecido jurídico do Brasil está completamente dilacerado.

Pelo jeito, estamos fazendo escola. Na Europa, já se começa a falar em tribunais muçulmanos para julgar muçulmanos. Em junho do ano passado, um tribunal na cidade de Lille, no norte da França, anulou a união de dois muçulmanos, porque o marido disse que sua esposa não era a virgem que alegava ser. O caso chocou o país, fundamentalmente laico, onde não se admite que a religião interfira na vida pública.

Ainda em 2008, Rowan Williams, arcebispo de Canterbury provocou alvoroço no Reino Unido ao sugerir que a adoção de elementos da lei Shariah islâmica no Reino Unido era “inevitável” para a promoção da coesão social. Os muçulmanos, disse o arcebispo, devem poder escolher que suas disputas matrimoniais ou financeiras sejam resolvidas em tribunais da Shariah, que lida com os assuntos da lei islâmica. Na Suécia, já existem tendências. Mais um pouco, e veremos mulheres infiéis ou meninas que tiveram relações antes do casamento sendo lapidadas em Piccadilly Circus ou no Kungsträdgården, em Estocolmo. E se um sueco ou britânico quiser matar a mulher e permanecer livre como um passarinho, bastará que se converta ao Islã

Evo Morales, o presidente da Bolívia, talvez contaminado pelos usos e costumes do vizinho incrível, ousou voar mais alto. Domingo passado, os bolivianos aprovaram ontem uma nova Constituição, impulsionada por Morales. Segundo o disposto na nova Carta os 36 "povos originários" – leia-se populações indígenas - passam a dispor de uma quota obrigatória em todos os níveis de eleição, a ter propriedade exclusiva dos recursos florestais e direitos sobre a terra e os recursos hídricos. Até aí, vá lá. Se bem que resta no ar a pergunta sobre se os indígenas teriam quadros intelectualmente preparados em número suficiente para o preenchimento dessas cotas obrigatórias.

Mas o insólito no novo documento é a instituição da equivalência entre a justiça tradicional indígena e a justiça ordinária do país, autorizando tribos a julgarem e punirem suspeitos de crimes segundo os seus costumes tradicionais, e não de acordo com os preceitos jurídicos herdados da colonização espanhola. Se ainda sei contar, teremos então 37 sistemas jurídicos diferentes. 36 das tribos bolivianas, mais um do
“invasor” espanhol. Não sei se Evo se deu conta, mas, a meu ver, partiu a Bolívia em 37 pedaços.

Poderá um país viver em harmonia com 37 justiças? É hora de relembrar o eterno Eça de Queirós que, em 1890, já escrevia: “Haverá talvez Chiles ricos e haverá certamente Nicaráguas grotescos. A América do Sul ficará toda coberta com os cacos dum grande Império!"