¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, setembro 30, 2008
 
SOBRE BUGRES E MUÇULMANOS


A propósito do sepultamento em vida de três mulheres no Paquistão, recebo as interrogações de um leitor.

O que me impressiona muito são pais que não satisfeitos em contaminarem seus filhos com religião, cegamente fazem o mesmo com as filhas. Ora, pelo que eu saiba são raríssimas as religiões que reservaram para as mulheres algum papel digno - e creio que ficaram como episódios históricos já devidamente esquecidos no tempo - em sua esmagadora maioria estão associadas ao "pecado" , ao "mal" , à "tentação diabólica". Qual a opinião do senhor sobre o fato de mulheres inteligentes, bem sucedidas adotarem religiões, se a própria religião não as considera pessoas lá muito dignas de respeito?

A pergunta suscita várias questões. Em primeiro lugar, mulheres inteligentes e bem sucedidas não adotam religião alguma. Muito menos homens inteligentes. Religião é coisa de pobres de espíritos, que se apavoram ante a intempérie metafísica. Ou de pessoas incultas, sem acesso à educação e à leitura. Ou de sacerdotes, que vêem neste medo uma extraordinária fonte de renda. Em segundo lugar, o leitor se refere ao episódio no Paquistão, país islâmico onde mulher não tem voz. Naquelas plagas, nem mesmo um homem pode não ter religião. Mulher então, nem pensar.

Todo ser humano nasce ateu. Ninguém nasce acreditando em deus ou deuses. Toda religião é decorrência da família e da escola, quando não do Estado. O brutal assassinato das irmãs Hameeda, Ruqqaya e Raheena estão chocando o mundo dito civilizado. Mas esta barbárie está bem mais próxima de nós do que imaginamos. Em fevereiro passado, eu comentava o direito que os indígenas brasileiros se reservam, o de matar filhos de mães solteiras e os recém-nascidos portadores de deficiências físicas ou mentais. Gêmeos também podem ser sacrificados. Algumas etnias acreditam que um representa o bem e o outro o mal e, assim, por não saber quem é quem, eliminam os dois. Outras crêem que só os bichos podem ter mais de um filho de uma só vez. Há motivos mais fúteis, como casos de índios que mataram os que nasceram com simples manchas na pele – essas crianças, segundo eles, podem trazer maldição à tribo. Os rituais de execução consistem em enterrar vivos, afogar ou enforcar os bebês. Geralmente é a própria mãe quem deve executar a criança, embora haja casos em que pode ser auxiliada pelo pajé.

No Afeganistão, políticos locais defenderam o assassinato das meninas como sendo uma questão de tradição. O senador Israrullah Zehri, do Baluchistão, disse se trata de "um velho costume", e teve o apoio de seu colega senador Jan Mohammad Jamili, que se queixou da "desnecessária politização" do caso. Mir Israhullah Zehri, um representante de Partido do Povo Paquistanês (PPP), do Baluchistão, apresenta como argumento uma justificativa cultural dos crimes de honra. "Estas são tradições que remontam há muitos séculos e eu sempre lutarei em favor da sua manutenção". Ou seja, os representantes máximos da nação aprovam incondicionalmente o enterramento em vida de três meninas que quiseram casar-se com homens que haviam escolhido. Para Ali Dayan Hasan, da organização Human Rights Watch (HRW), com sede em Nova York, os comentários de Zehri são “abomináveis e doentios".

Ora, a prática do infanticídio – e mesmo o sepultamento com vida de crianças - já foi detectada em pelo menos 13 etnias no Brasil, como os ianomâmis, os tapirapés e os madihas. Só os ianomâmis, em 2004, mataram 98 crianças. Os kamaiurás matam entre 20 e 30 por ano. E tudo isto sob os olhares complacentes da Funai, que considera que os brancos não devem interferir nas culturas indígenas. Mesmo entre os sacerdotes católicos que vociferam contra o aborto, não encontramos um só que denuncie estes assassinatos. Muito menos supostos humanistas da HRW se escandalizem com tais práticas.

Um outro leitor acha que a “barbárie relatada (no Paquistão) poderá ter sido, tanto um ato odiento, execrável, repelente, como um exemplo modelar de justica. Tudo dependera do que suceder aos executores. Só há crime quando há castigo, proporcional. Impunidade institui a regra”.

Então será regra. Ou melhor, já é regra. Nada acontecerá aos executores. O instigador do assassinato seria Abdul Sattar Umrani, que não é ninguém mais que o irmão de Sadiq Umrani, o ministro da habitação do governo do Baluchistão, um respeitado membro do PPP, o partido do clã dos Bhutto que está atualmente no poder no Paquistão. Segundo os jornais, o PPP tenta evitar ofender os chefes de tribos do Baluchistão, uma província que contribuiu de maneira decisiva para a eleição, em 6 de setembro, de Asif Ali Zardari, o viúvo de Benazir, para a presidência do Estado.

Da mesma forma, nada acontece aos animais que lapidam mulheres nos demais países muçulmanos. Muito menos aos animais que neste Brasil do século XXI enterram vivas suas crianças. Bugres e muçulmanos em muito se parecem.