¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, outubro 24, 2006
 
SÚBITO JURISCONSULTO DEFENDE
O SAGRADO DIREITO DE MENTIR




Semana passada, o "filósofo" americano David Livingstone Smith andou dando entrevista à Veja. Segundo Smith, o mundo seria um caos se todos decidissem falar a verdade. O homem seria programado para enganar desde os primórdios da humanidade. Seja para proteger-se, seja para levar vantagem. Quem mente com desenvoltura, diz ele, pode até sobressair entre os demais. O exemplo clássico é o dos políticos, que mentem por profissão e continuam tendo o ouvido de milhares de pessoas. "A mentira está por toda parte. Ela é normal. Todos mentimos e quem diz o contrário mente. Temos dificuldade em nos reconhecer como mentirosos porque há um julgamento moral contrário. Mentimos para obter vantagens e para nos proteger de algo, o que significa que estamos, de certa forma, passando a perna em alguém. Quem mente bem costuma se dar melhor do que quem não consegue fazê-lo".

O governador eleito da Bahia, Jacques Wagner, parece ter lido a entrevista e a entendeu a seu modo. Em entrevista ao Estadão, disse que os petistas acusados de tentar comprar o dossiê Vedoin podem estar mentindo em seus depoimentos à Polícia Federal quando dizem não saber de onde veio o dinheiro (R$ 1,75 milhão) que seria usado na negociação do material destinado a envolver políticos tucanos com a máfia dos sanguessugas. Mas fez a ressalva:

- Ao réu é dado o direito de mentir, então não acho que o réu petista seja diferente de outros réus. Eu não estou defendendo que eles mintam. Estou dizendo que eles estão usando do direito, concedido pela lei, de que o réu não é obrigado a dizer toda a verdade. Se não fosse assim, seria simples descobrir os crimes. Eu posso estar com toda indignação em relação a esses que produziram tanto desgaste na reta final da campanha do presidente, mas, antes de eles serem petistas, são cidadãos brasileiros que se abrigam na lei.

O político petista, sem ser magistrado, está querendo criar jurisprudência. Não existe em lei alguma o direito de mentir. O que existe é o direito do réu de não incriminar a si mesmo. Este direito, Jacques Wagner o interpretou generosamente como direito de mentir. Os réus poderiam, por exemplo, afirmar tranqüilamente que o famigerado dossiê é obra do PSDB e estariam, segundo o súbito jurisconsulto, exercendo um direito sagrado. Vigisse esta exótica tese, mesmo assim deixaria brechas para deduções perigosas para a república petista. Segundo o novel jurisperito, o direito de mentir concerne ao réu. Quem não é réu - deduzimos - não goza deste direito sagrado.

Lula não é réu. Para melhor preservá-lo, Wagner poderia ter citado a constatação de Smith: "Quem mente com desenvoltura pode até sobressair entre os demais. O exemplo clássico é o dos políticos, que mentem por profissão e continuam tendo o ouvido de milhares de pessoas".

Se todos os homens do PT decidissem falar a verdade seria realmente um caos. Não digo para o mundo, mas pelo menos para a bandidagem que tomou posse do poder. Wagner o confirma.