¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quinta-feira, abril 27, 2006
 
CORRUPÇÃO?
JAMAIS!
LEI ROUANET



Quem já assistiu a um espetáculo do Cirque du Soleil, seja ao vivo, seja na televisão, teve o privilégio de ver certamente o mais belo show circense atualmente produzido no mundo. A trupe canadense deve se apresentar em agosto no Brasil, com ingressos entre R$ 50 (meia-entrada) e R$ 370 (VIPs). Infelizmente, isso diz respeito a todos nós.

Por que infelizmente? - se perguntará o leitor -. Não é um sumo privilégio ver o Cirque du Soleil? De fato, é. Mas você, assista ou não assista ao espetáculo, estará com ele comprometido. A Folha de São Paulo de ontem nos conta que a empresa CIE (Companhia Interamericana de Entretenimento, de origem mexicana), que promove a vinda do espetáculo Saltimbanco ao Brasil, já descobriu os meandros da corrupção pátria institucionalizada, sendo autorizada pelo MinC (Ministério da Cultura) a ficar com R$ 9,4 milhões que o governo receberia em Imposto de Renda neste ano. O dinheiro agora deve ser usado em benefício das apresentações.

Vivemos dias em que o combate à corrupção é palavra de ordem. Mas ninguém parece ver nada demais no financiamento de shows com dinheiro público, que depois serão vendidos a altos preços ao mesmo contribuinte que os financia. Esta é a finalidade da Lei Rouanet, criada em 1991, para que empresas e pessoas físicas incentivem a cultura, destinando parte de seus impostos a projetos culturais. Como depois vai faltar dinheiro para financiar atividades essenciais, o governo volta de novo a enfiar a mão em seu bolso para financiá-las.

Você financia o Cirque du Soleil. Mas por enquanto os ingressos estão à venda só para os clientes Prime (prioritários) do Bradesco, que decidiu patrocinar o grupo no Brasil. "É desejável que marcas se associem a produções culturais, desde que o dinheiro seja privado", diz o consultor em patrocínio empresarial Yacoff Sarkovas. Segundo dados do MinC, a CIE captou R$ 7,1 milhões até agora, dos R$ 9,4 milhões autorizados.

Tudo muito simples: você paga para que uma minoria se divirta. Esta minoria, que também é contribuinte, já pagou a produção do espetáculo. E agora paga de novo para assisti-lo.

Além do patrocínio ao Cirque du Soleil - informa-nos a Folha - a CIE foi autorizada a captar R$ 5,1 milhões para a continuação da temporada paulistana do musical O Fantasma da Ópera durante o ano de 2006. E a Dialeto Latin American Documentary Ltda foi autorizada a captar R$ 197 mil para o CD Pajelança Cabocla, de Zeneida Lima, "pajé cabocla da ilha de Marajó". O projeto estipula que as 3.000 cópias do álbum deverão ser assim distribuídas: mil exemplares para os produtores, 850 para os autores, 750 para os patrocinadores, 300 para Bibliotecas Minc e 100 para a mídia.

E para mim? - estará você se perguntando. Para você nada, nadinha, exceto o sublime prazer de estar contribuindo de seu bolso para a cultura nacional. E assim se faz cultura no Brasil. Nem ouse pensar em corrupção. O gesto de enfiar a mão em seu bolso está devidamente regulamentado por lei.